segunda-feira, outubro 02, 2006

Meu nome é Rogério e eu vou morrer.

O mais engraçado é que eu sei disso. Por isso parei de tentar fazer o paraquedas abrir. Quando se puxa a corda e ele não abre, se tenta puxar o reserva. Se esse não abre também, vem o pânico. Não para mim. Quando nada funcionou depois de horas de check-up e manutenção e uma última verificação você tem certeza que você e o chão vão se encontrar em breve. Podia pelo menos ser especial, sabe? Esse é meu sexagésimo terceiro salto. Não é nem um número redondo, nem cabalístico, nem significativo e não chega nem de muito longe ao recorde de 36.000 saltos de Don Kellner. E caindo de 50.000 pés, nem a metade do recorde de 102.800 daquele capitão da força aérea americana. Eu vou morrer de uma forma patética! E não posso falar nada para ninguém antes disso.

É pior do que descobrir que se tem câncer terminal. Pois mais hardcore que seja a porra do tumor, você pode sair dalí e ir se divertir uma última vez. Gastar todo seu dinheiro, conseguir um último beijo na boca, jogar uma última partida, fumar um maço de cigarros. Não assim. É como se Deus tivesse posto uma arma na minha cabeça e falasse: "Reza, filho, reza agora." Eu tenho mais uns dois minutos pra repensar a vida antes de virar amendocrem no asfalto. Mas o que eu acho mais ridículo é não ter ninguém por perto. Nem um outro paraquedista do lado para agarrar, nem um celular para ligar para alguém e dizer "agora, fodeu.", nem se eu fosse gay eu poderia, num último minuto de glória, gritar para todo mundo ouvir a verdade absoluta e sair do armário em grande estilo, explodindo em purpurina rosa quando acertasse a superfície do planeta. Ou ainda descobrir que eu sou um super-herói e pairar antes do impacto. Ou por algum milagre natural um lago se abrisse sob mim. Poderia pelo menos cair sobre uma passeata do presidente e ver se eu acertava o desgraçado. hahaha. Não tenho nada. Mulher, filhos ou mesmo um cachorro pra sentir minha falta.

Talvez seja melhor mesmo, sabia? Talvez essa seja uma maneira delicada de ser chamado para o além vida. Ah! Na boa, poderia ter morrido dormindo. Daí sim seria delicado. Não esparramado no asfalto. Na velocidade que eu vou bater vão me tirar da estrada com um rodo. Mas sinceramente estou em paz. Meio puto com tudo isso mas em paz. Abro meus braços agora para meus últimos dez segundos de vida no planeta. Agradeço a todos pela atenção e pelas coisas que eu tive, pelos amores que eu vivi e por aquele monte de coisa que a gente não lembra de bate-pronto mas que são importantes de se dizer antes de morrer. Eu nunca plantei uma árvore, nunca tive um filho nem escrevi um livro. Vou virar "o cara que morreu ontem. Semana passada. Ano passado. E daí viro estatística.". Foda-se. Pai nosso que estais no céu, santificado seja o vosso nome, venh!!

5 comentários:

Anônimo disse...

Cassete, foda esse texto... Consegui me colocar no personagem... Amanhã saio falando pra todo mundo o que penso e sinto...

Anônimo disse...

"Pois POR mais hardcore..."

Tirando os erros de português de praxe, o texto ficou bem bacana. Pode parecer viadagem, mas fiquei até arrepiado. Acho que você tá começando a pegar o jeitão da coisa.

Anônimo disse...

Tenho medo de morrer assim... Afora os conceitos filosóficos da "coisa", gostei do texto.

Anônimo disse...

Bacana.. Mas que medo disso! rs

Lady disse...
Este comentário foi removido pelo autor.