segunda-feira, abril 16, 2007

Tenho quase certeza que foi o mentolado gosto da pasta de dente afixado na sua língua que me deixou enjoada o resto do dia. Naquele beijo sobre o sorriso opaco antes de sair de casa. A promessa de um mal presságio cultivado pela rotina ignorante dos nossos dias mais felizes. Eu nem havia levantado da cama ainda quando o telefone tocou.

Eu não perguntei seus motivos, nem questionei as razões da covardia plácida de dizer para mim ao telefone que não aguentava mais. Que não mais se sentia vivo. Que iria embora. Eu ri. Afinal, pelo menos ele não havia saído para comprar cigarros e materializado a profecia urbana. Se não me engano eu deixei o telefone cair. Batendo forte no chão, junto com meu corpo. Uma sensação de liberdade e excitação explodiram dentro de mim. Eu sorri complacente e o mundo todo ganhou outra coloração. Eu estava feliz pela primeira vez em muito tempo. Realmente feliz.

Não peguei nada do armário ou lembrei de trancar a porta ao voar para fora de casa. Daquele lugar maculado onde tanta coisa negra vivia. E atravessei a rua, atravessei o medo, bebi a incerteza com gelo e vodka e música. Caminhei saltitante pela estrada solitária em direção ao mundo sem paranóias, sem análises, sem neuras e principalmente sem lágrimas. Sem as promessas sem propósito.
E ao final desta estrada eu percebi exatamente quem eu era, eu me reconheci no reflexo balbuciante desenhado no espelho.

Eu não estava feliz. Eu era a felicidade.
Eu não estava alegre. Eu era a alegria.
Eu não estava bem. Eu era uma farpa da onipotência divina.

Ganhei minha liberdade quando larguei aquele corpo aos prantos no chão do quarto, para nunca mais voltar.

Written by - Verônica Prata

2 comentários:

Anônimo disse...

Ambos os textos estão animal... Uma leitura que qualquer barulho pode atrapalhar...

Da hora fio!!

Lady disse...
Este comentário foi removido pelo autor.