segunda-feira, agosto 28, 2006

-Boa noite. Espero não estar incomodando. - disse eu, aparecendo do nada no meio da sala onde ele estava se divertindo com cocaína e prostitutas. - Você sabe quem eu sou?
Ele deu um salto para trás assustado, arregalando os olhos e observando os detalhes da figura macabra à sua frente. O vestido negro longo cobrindo seu corpo, minha pele inconcebivelmente branca, meus olhos totalmente negros, a falta de expressão no meu rosto. Demorou alguns segundos ainda, depois das duas moças nuas gritarem e se afastarem da mesa de centro, para que ele tomasse uma atitude corajosa e empunhasse a pistola cromada que repousava sobre a mesa. Apontou para meu peito, o centro da misteriosa figura à sua frente e falou em voz áspera, alta e trêmula:
-Quem raios é você? Como entrou na minha casa? Como passou pelos seguranças?
-Eles não me viram. Na verdade, estou lhe dando a honra de me ver. Isso é algo que pouquíssimas pessoas recebem. Geralmente eu separo a vida de seus corpos frágeis antes que elas mesmo saibam o que está acontecendo.
-O que foi, gatinho? Você assustou a gente. - disse uma das meninas, olhando em volta para a sala vazia. - O que você está fazendo com essa arma?
-Percebe? Elas não podem me ver. - disse, colocando as mãos atrás das costas, paciente. - Peça para que elas se retirem da sala, por favor.
Ele obedeceu, cada vez mais incomodado com aquele delírio tão realista. Ignorou as perguntas das garotas e as mandou para outro comodo. Gritou com elas. Inclusive bateu em uma para que se apressasse. Ele nunca teve educação com mulheres.
-Pronto, - disse ele novamente - agora me responde quem diabos é você, mulher!
-Não estou aqui por você ter sido bom ou mal pois isso são conceitos sociais. Não existe certo ou errado. E antes que você cite os dez mandamentos, posso lhe assegurar que foram apenas diretrizes criadas por Deus para que sua criação prima pudesse prosperar sem se destruir. Para que vocês pudessem viver em sociedade. Estou aqui simplesmente pois seu tempo acabou. Chegou no ápice de sua existência. Afinal, você não achou realmente que fumar, beber e cheirar cocaína por dezesseis anos consecutivos fosse realmente fazer bem ao seu corpo, não é?
-Você é a morte! Meu Deus, você é a morte! Saia da minha casa!! - e ele disparou contra mim algumas vezes. Os projéteis terminaram suas trajetórias na parede atrás de mim, quebrando vasos e perfurando alguns quadros.
-Como vê, suas suspeitas de que isso seria inútil se confirmaram. Talvez agora você possa agir civilizadamente.
Ele chorou. Um homem forte, poderoso e são, chorou novamente depois de mais de trinta e oito anos. Deixei que ele terminasse e escutei sua lamentação subsequente.
-Mas então porque vem me torturar dessa forma? É o mesmo que me apontassem uma arma para a cabeça! Por quê não me levou simplesmente? Não existe maneira de lhe convencer o contrário? - disse ele, agora sem uma lágrima no rosto.
-Deixei que me visse pois gosto de você. Gosto de pessoas realmente corajosas e ambiciosas, que enfrentam seus problemas e os obstáculos impostos pelos senhores da criação de maneira adequada. Sendo assim, eu lhe proponho uma morte limpa. Você não sentirá nada. Apenas irei separar sua essência do invólucro mortal que a envolve e iremos para o Limbo, onde será preparado para sua próxima existência. Você aceita vir comigo, por vontade própria?
-Não posso. Apesar de eu ter feito diversas coisas ruins na minha vida, sou um homem de família. Amanhã é aniversário de dois anos de minha filha. Deixe-me vê-la uma vez mais. Depois da festa você pode me levar. Eu lhe imploro.
-Isso não me comove, meu caro senhor. Não pelo fato de você ter uma filha pequena e uma mulher submissa e estar nesta casa se divertindo com drogas e prostitutas. Não pelo fato do seu arrependimento, pois como disse, certo e errado são conceitos sociais criados por Deus e seguidos pelo homem com o simples propósito de organização. Mas, se é assim que você deseja, esta foi a sua escolha. Eu retornarei amanhã.
Desapareci de sua visão repentinamente. Ele agradeceu de joelhos, com as mãos juntas ao peito como se tivesse a certeza de que Deus em pessoa pudesse realmente ouví-lo. Se vestiu decentemente com seu melhor terno, pôs as garotas de programa para fora de sua casa e ligou para sua mulher, dizendo que estava com saudades e convidou-a para jantar. Cheirou uma última carreira de cocaína antes de sair de casa.
Demorou quase dez minutos para morrer, sob o torturante sofrimento causado pela overdose.


2 comentários:

Anônimo disse...

Faça sempre a primeira escolha, é isso??? hahahahah... Mas ficou da hora o texto...

Lady disse...
Este comentário foi removido pelo autor.